Saturday, March 1, 2014

[cartas ao meu filho] esta coisa de ser mãe...

... é difícil. Eles crescem demasiado depressa e não sabemos se os estamos a educar da forma correta. Eu tenho fé que este meu pirata subnutrido perceba que o que os pais fazem é sempre o que acham mais certo para os filhos. Eu não sou nem melhor nem pior que os outros, mas se é assim que eu acredito, é assim que o vou educar. No outro dia fui buscá-lo à escola sozinha. Olhei para trás, já sentada no carro, e vi-o. Bolas, está tão crescido. Ainda me lembro dele pequenino como se tivesse sido ontem. Ainda é pequenino, mas está tão crescido. Gostava que ficasse assim para sempre.

"Sempre foi fácil aturar-te... há quem diga que pioraste com o tempo. Mas essas pessoas não estavam lá na nossa primeira noite juntos. Tu não querias comer, e preferias chorar. Choravas alto e forte. O que mais barulho fazia naquele quarto de oito mães desesperadas, que só queriam uns minutos de silêncio para poderem descansar. Quando te calavas, um outro bebé qualquer começava a chorar e tu, pumba, juntavas-te a ele. A segunda noite foi igualmente difícil. Já eu duvidava da minha capacidade de ser mãe, quando a enfermeira (da qual não sei o nome nem lhe reconheceria a cara, mas a quem agradeço profundamente) decidiu levar-te com ela para eu descansar. Descansei umas horas, graças à santa enfermeira, e a terceira noite foi fácil. Adormecemos juntos e dormimos 6 horas seguidas. Tive que te acordar para comer, pois já estava com medo que tivesses voltado ao teu jejum. A partir daí as coisas começaram a correr bem entre nós. A enfermeira deve-te ter dado um raspanete. Qualquer coisa do género "já chega de dares cabo da cabeça da mãe, porque ela já está desesperada e a ponto de te atirar pela janela". 

Ainda me dás noites complicadas. Habituei-me a acordar milhares de vezes por noite, para me certificar que estás bem. Outras tantas, porque tu me chamas, seja para pedir xixi, água ou apenas para dizeres que me amas. A minha mãe pergunta-me se não era mais fácil levar-te para a minha cama (como ela fazia comigo). Eu já tentei, mas tu gostas do teu espaço. Então, eu continuo a levantar-me de noite para me certificar que estás tapado ou que não decidiste cair da cama alta que te decidi comprar (e que me atormenta muitas vezes, não vás tu cair dali para baixo). 

Tirando as noites difíceis, e a tua resistência a comida, sempre foste um miúdo muito fácil. Dizem que sou demasiado paciente e até conivente contigo, mas a mãe sou eu e eu é que sei. Gosto de te educar assim. Acho que tenho feito um bom trabalho. Não temos palmadas, nem castigos. Perdoa-me se às vezes levanto o tom de voz. Sabes que não é isso que quero fazer, mas tu, por vezes, consegues tirar-me do sério, e lá se vai a parentalidade positiva pelos ares, e sai um berro mais alto do que devia. Também sabes que quando conto até três, tens mesmo que vir. Não sabes o que acontece depois do três. Nunca quiseste testar. Nem eu sei o que acontece depois do três. És educado. Às vezes esticas a corda. Mas eu percebo. Também vives semana sim, semana não com educações diferentes, e isso deve baralhar-te. Por mais que tentemos ter educações semelhantes, as "crenças" são diferentes. Eu disse ao teu pai para ler a Magda. Ele mandou-me ler o OZ. Lá está, cenas diferentes que nos baralham a cabeça sem sabermos qual é a correcta. O pai castiga, mas a mãe não! O pai deixa fazer tudo, mas a mãe não! O pai deixa deitar tarde, mas a mãe não. E o pai promete prendas se te portares bem, e a mãe não!

Apesar de tudo isso, a má sou sempre eu. Mas aceito esse lugar. Já te expliquei que o meu pai também era mais permissivo, e que a minha mãe era bem mais rígida, mas é por causa deles que eu sou assim, boa mãe. E eu sei que por causa de mim também vais ser bom pai.

No outro dia fomos ao médico. Coisa rara de acontecer, mas lá estávamos os três - eu, tu e o pai. Portaste-te tão bem. Olhei para ti de boxers, sentado na marquesa que era um grande dinossauro, e vi um homenzinho. Não abriste a boca um segundo e o doutor até achou que tinhas perdido a língua. O pai logo a seguir prometeu-te uma prenda por te teres portado tão bem. Eu não disse nada. Quando subimos no elevador para casa perguntaste-me se também tinha uma prenda. Eu disse-te que não. Mas tu querias, porque o pai tinha. Expliquei-te que a tua obrigação é portares-te bem. Que as prendas estão reservadas para os anos e o natal, ou noutros dias que nós acharmos por bem oferecer-te uma prenda. Mas não por te portares bem. Se eu não te castigo quando te portas mal e converso contigo para que percebas o que aconteceu, também não faz sentido dar-te uma prenda quando te portas bem, mas sim conversar e dar-te os parabéns. Acenaste com a cabeça e perguntaste se podias comer uma goma antes de jantar como prémio. Eu disse que sim. És inteligente e sei que percebes o que te digo, mesmo que às vezes comeces aquele choro falso que me irrita e com o qual consegues muitas vezes o que queres. Mas não comigo! Quando te abro os olhos e te pergunto "estás a chorar porquê?" tu páras. Eu vou manter esta minha coisa da parentalidade positiva. Acho que está a correr bem. E acho que eventualmente terei muito sucesso. Estaremos cá os dois para falar sobre isso, mais tarde."





Aquele beijo,
*muah*
Ana

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